Há menos de um mês para o encontro climático mais esperado do mundo, a COP26, o governo brasileiro mais uma vez se coloca em uma posição vexatória e irresponsável em uma reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, rejeitando a existência do conceito “racismo ambiental”.
É importante observar que o relatório da ONU cita como exemplo de situação de racismo ambiental o caso das comunidades quilombolas no Brasil.
A crise climática, no mundo todo, afeta diariamente as populações negras e indígenas. No Brasil, a maioria da população é negra, que representa hoje 56% do país. Negar o racismo ambiental é negar todas as formas de racismo, é negar a realidade nas periferias, o aumento da fome, do desmatamento em territórios quilombolas e terras indígenas e aplicar o que esse governo mais sabe fazer, o discurso negacionista.
Mesmo diante de uma pressão cada vez maior de movimentos negros de todo o mundo para que se reconheça a dimensão racial da crise climática, o governo Bolsonaro dá contornos racistas ao debate urgente de sobrevivência do planeta e das pessoas mais vulneráveis.
Negar o racismo e o colapso ambiental é prática comum do governo racista de Jair Bolsonaro.
Tão comum, que lá em meados de 2017, o então pré-candidato à presidência da República, após visitar um quilombo, no interior de São Paulo, disse em evento do Clube Hebraica do Rio de Janeiro, que “o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriadores servem mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gastado (sic) com eles”. E como disse, já como presidente, em março de 2020, seu governo não demarcaria nenhuma terra quilombola, apesar de ser um direito garantido pela Constituição Federal de 1988, que completa 33 anos nesta terça (05).
O governo de Jair Bolsonaro foi o que menos reconheceu comunidades quilombolas, com os menores índices alcançados desde 2004, quando as regras atuais de certificação foram criadas. Hoje são mais de três mil comunidades quilombolas no Brasil, segundo reconhecimento da Fundação Palmares, instituição que desde a presidência de Sérgio Camargo tem sido constantemente controversa sobre questões raciais. Até hoje, pouco mais de 300 comunidades foram regularizadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
A 26ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26) será um espaço importante para cobrar medidas concretas dos países e para colocar no centro das discussões a defesa dos direitos humanos nos países mais pobres ou com um governo negacionista. É preciso combater o racismo ambiental e enfrentar com coragem esses debates na agenda ambiental mundial. É uma oportunidade de exigir soluções para a emergência climática que priorizem também combater a injustiça social e racial. Precisamos de ações climáticas em nível internacional, que reconheçam essa verdade que o governo brasileiro nega: justiça climática é justiça racial.
As pessoas parecem ter despertado para a existência do racismo estrutural e da injustiça ambiental. A pandemia da COVID-19 escancarou como pessoas pobres, negras, mulheres, populações indígenas são afetadas de maneira desigual. Para estabelecer as melhores saídas e planos de recuperação, precisamos primeiro reconhecer que o debate racial é central no debate climático, para depois fazer com que a economia vá para um modo sustentável e tenhamos uma transição justa, que lide com as desigualdades sociais e econômicas que existem.
São as populações, nos territórios marginalizados, que menos contribuem para a crise climática. Mas são as mais atingidas diariamente, pois foram transformadas em vulneráveis pela colonização que chegou atravessando tudo com o racismo. Talvez esse debate deveria ser a principal pauta de um encontro internacional sobre a crise climática, mas não só. Deveria ser pauta central em qualquer projeto político. Tanto o debate climático, quanto o movimento por justiça racial precisam ser centrais nas discussões. Essas questões são indissociáveis. E é preciso descolonizar as discussões internacionais com urgência.