A partir de hoje, dia 1º de novembro, governos e sociedade civil se reunirão em Glasgow, Reino Unido, para a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 26). O objetivo central do debate é a descarbonização do planeta por meio da redução das emissões de gases de efeito estufa. O Movimento Negro Brasileiro embarca para a conferência representado por diversas organizações e também por instituições que compõem a Coalizão Negra por Direitos, uma articulação que reúne mais de 250 organizações, movimentos sociais de base e pesquisadoras (es) negras (os) do Brasil. 

No dia 05, das 14h às 15h15 (horário local), o movimento realiza o evento “Terra, territórios e o enfrentamento ao racismo nas lutas contra a crise climática: o Movimento Negro Brasileiro na COP 26”. Trata-se de um espaço de debate sobre o papel do movimento negro no debate climático e a importância dos territórios quilombolas, do campo e da cidade para um caminho com futuro melhor. 

A passagem por Glasgow contará ainda com participação em mobilizações, como a “Global Day of Action”, no dia 06, além de articulações com movimentos negros de outros países, principalmente africanos, que possuem papel fundamental para a aprovação de signatários climáticos, uma vez que são numerosos e possuem suas características e demandas específicas em relação ao clima.

Uma comitiva de delegadas (os) quilombolas, ativistas, militantes e pesquisadoras atuará contra o racismo ambiental, pela redução do aquecimento do planeta, pelo desmatamento zero nas florestas Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica e Caatinga brasileira e em defesa da titulação das terras e dos territórios quilombolas. A missão ainda consiste em levar a mensagem de 56% da população brasileira que sofre com os efeitos da emergência climática em seu dia-a-dia, mas ainda não se vê representada nas políticas públicas sobre o tema e no processo de tomada de decisão. 

Trata-se de uma oportunidade de exigir soluções para a emergência climática que priorize o enfrentamento ao racismo ambiental, as desigualdades racial, de gênero e social, com a urgência que o planeta precisa. Entre elas, o dever ético e humanitário de a corrida global pelo carbono zero, a aprovação do artigo 6ª do Acordo de Paris e o investimento de U$ 100 bilhões anuais nos países em desenvolvimento produzirem justiça climática e justiça racial. 

Entre os líderes do movimento negro, Douglas Belchior, historiador, cofundador da Uneafro Brasil e da Coalizão Negra Por Direitos, destaca que a pandemia de Covid-19 e o racismo evidenciaram como a população negra é afetada de forma diferente, mais grave, pelas diversas crises vividas no mundo.

“Os países em desenvolvimento e pobres não poderão ser colônias e novamente serem impactados pela nova industrialização “carbono zero”. Não temos mais tempo para pensar na perda dos lucros das corporações transnacionais, as vidas não poderão ser medidas pelo crescimento econômico das mesmas economias que não agiram de forma humanitária para salvar as mais de 4 milhões de vidas com a pandemia Covid-19. A maioria das mortes eram evitáveis no Norte e no Sul Global, se não estivessem em extrema vulnerabilidade social e ambiental”, criticou ele.

Territórios quilombolas como solução ao desmatamento

O Brasil possui hoje mais de 3.000 comunidades quilombolas e pouco mais de 10% disso já foi regularizado. Entre 1995 e 2021, foram titulados plenamente pelo INCRA e órgãos estaduais de terras só 137 territórios quilombolas, somados aos 52 territórios quilombolas parcialmente titulados são 189 (cento e oitenta e nove) territórios com regularização fundiária, o que representa 13% de todos os processos de titulação abertos no país. Até 2030, o Brasil precisa concluir 1.486 processos de titulação territorial quilombola nas regiões Norte, Nordeste, Sudeste e Centro Oeste, abertos no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), para regularização fundiária pelo Governo Federal e/ou Estadual.

“Afirmamos que soluções efetivas para redução das emissões dos gases de efeito estufa residem na demarcação de terras indígenas e quilombolas; e na defesa das terras coletivas e dos direitos territoriais. Não são as populações negra, pobre, periférica, quilombola ou indígena, as responsáveis pelo agravamento da crise climática. Essas são as principais populações vulnerabilizadas pela irresponsabilidade de outros grupos sociais e econômicos”, destaca Kátia Penha, coordenadora nacional da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ), que também estará na COP26.

Além de Kátia, outros representantes de quilombos de diversas regiões do Brasil também estarão no evento: Sandra Braga, agricultora e agente de turismo; Cleiton da Purificação, estudante de Engenharia Agronômica; e Hilton Durão, engenheiro agrônomo, mestrando em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável. 

Todos estes pontos reforçam como o racismo ambiental é central para o debate climático, uma vez que além de mais expostas a diversos riscos, a população negra não participa do processo de tomada de decisão. Por isso, também estarão representantes do movimento negro na COP: Diosmar Filho, geógrafo e pesquiador do Iyaleta – Pesquisa, Ciência e Humanidades; Amanda Costa, ativista climática, fundadora do Perifa Sustentável e jovem embaixadora da ONU; Hannah Balieiro, presidente do Instituto Mapinguari, Raull Santiago e Jefferson Barbosa, do PerifaConnection.

“A pandemia e o racismo vistos em suas profundidades, estabelecem que as desigualdades raciais e de gênero produzidas no mundo precisam ser combatidas. Precisamos estabelecer um cuidado com o planeta, um cuidado do ponto de vista da humanidade. E nossa humanidade envolve combater o racismo em sua dimensão ambiental para garantir à população negra e indígena os direitos de humanidade. Com isso, vamos naturalizar o ser humano”, afirma Diosmar Filho, geógrafo e pesquisador do IYALETA – Pesquisa, Ciência e Humanidades.

Pular para o conteúdo