A ex-aluna do Núcleo Virtual de Educação Popular da Uneafro Brasil, Franciele Silva, foi selecionada para o programa de bolsas para indígenas e quilombolas do Alto Comissariado das Nações Unidas de Direitos Humanos (ACNUDH), órgão pertencente à Organização das Nações Unidas (ONU). Franciele tem 23 anos e mora no Quilombo Rio dos Macacos, comunidade localizada na região metropolitana de Simões Filho, na Bahia. 

O programa encerrado em julho de 2023 visou formar lideranças para debater soluções às crises do clima e da biodiversidade. As vagas foram disponibilizadas pela Forest Stewardship Council Indigenous Foundation (FSC-IF), um comitê consultivo global de representantes indígenas de todas as regiões do planeta para assessorar o Conselho Internacional de Manejo Florestal no sistema de certificação FSC e salvaguardar os direitos dos povos tradicionais

A formação foi dividida em duas etapas. A primeira em Brasília (DF), com duração de três semanas, em colaboração com uma instituição acadêmica nacional. A segunda etapa é um treinamento prático realizado durante um mês na cidade de Genebra, na Suíça, na sede do ACNUDH. Dentre os temas abordados na formação, os principais mecanismos da ONU para a defesa dos direitos humanos de povos e comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas são os destaques

Franciele foi a única quilombola do Nordeste a ser selecionada pelo projeto. A jovem que passou pelo cursinho pré-vestibular da Uneafro, hoje, é estudante do curso de Direito pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).

“Foi uma experiência única, tivemos acesso a uma formação excelente em direitos humanos, mas para além disso, levamos nossos conhecimentos e as lutas das nossas comunidades. O curso foi uma troca de vários povos/comunidades de vários lugares do mundo, foi tudo enriquecedor demais. Foram 3 semanas de formação e na 4ª acompanhamos uma sessão de perto, fazendo até intervenção. Ainda estou adaptando a melhor forma de apresentar tudo para a minha comunidade, foi inclusive um dos requisitos para a seleção”, contou sobre sua experiência.

Quilombolas pelo direito ao seu território

O Quilombo Rio dos Macacos vem sofrendo há décadas uma disputa com a Marinha Brasileira. O conflito começou nos anos 1970, depois que a Base Naval de Aratu foi construída e a União pediu a desocupação da área pelos quilombolas.

O órgão militar está construindo uma vila naval da barragem dentro do quilombo e desapropriando diversas famílias, dividindo a comunidade em duas partes. “A comunidade foi titulada com 97 hectares e, visto que possuímos mais de 900, isso se resumiu em 301 hectares. Desses, apenas 64 foram demarcados. Porém, nessa demarcação não tem nem fonte nem rio. A Marinha, quando invadiu a nossa comunidade, construiu uma barragem dentro do nosso rio”, explica Franciele.

A comunidade Quilombo Rio dos Macacos entregou, em maio deste ano, uma carta ao presidente Lula que relata a situação do território. Eles aguardam algum retorno por parte do governo, foram inúmeros anos de luta e denúncias sem respostas. “Não há nenhum tipo de política pública. Não temos iluminação pública, saneamento básico, as casas, muitas delas estão em situações precárias, de desabamento mesmo. Estamos na época de chuva, inclusive aqui em Simões Filho, não temos estrada independente. Nosso acesso é por dentro da Vila Naval, acesso esse em que, muitas vezes, sofremos diversas violências. As violências são constantes em nossa comunidade e a gente grita por socorro o tempo todo”, denuncia.

No anseio de defender sua comunidade, Franciele se inscreveu para o programa de bolsas e foi selecionada ao lado de outros dez candidatos pelo Programa do Alto Comissariado das Nações Unidas. “Tivemos algumas reuniões informais, numa delas nos reunimos com um relator e consegui enviar um documento que continha a situação das comunidades quilombolas e do meu território, nele tinha algumas recomendações e duas delas foram acolhidas no relatório final. Isso foi uma conquista muito grande para mim e para as comunidades quilombolas!”, ressalta. 

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